ão fofinho, filé de peixe empanado, queijo cheddar e molho tártaro. Empilhando esses ingredientes você tem o McFish, sanduíche do McDonalds que, após cinco anos de ostracismo, voltou à rede de fast-food em janeiro deste ano.
O retorno é por tempo limitado, e veio em formato inédito: para adquiri-lo, o cliente podia entrar em uma pré-venda pelo aplicativo, que durou cerca de duas semanas, e escolher a data e local nos quais gostaria de retirar o pedido, ou pagar um frete de entrega a domicílio. O preço do combo médio (com batata e bebida) é R$ 30,90.
Ainda, aos consumidores que quisessem tentar a sorte, também seria possível fazer o pedido em seu McDonalds local a partir do dia 06 de fevereiro (e rezar para que o estoque desse conta).
Seguro dizer que as preces não foram suficientes — nem aos que esperaram nem ao pré-venders. A previsão era que o lanche estivesse disponível até dia 18/02, este domingo, mas a demanda foi tamanha que o McDonalds não conseguiu supri-la: a maior parte das unidades relatou esgotamento completo do produto.
Um mutirão de fãs enraivecidos, então, se dirigiu às redes, irritados com o novo chá de sumiço do lanche do aplicativo e das lojas. Pessoas que compraram na pré-venda receberam outros combos no lugar, e clamam justiça, ou ao menos mais estoque do sanduíche de peixe. Que se instaure a CPI do McFish.
Claro, a ideia do McDonalds nunca foi que os consumidores tivessem acesso ao lanche de maneira ilimitada. A escassez fazia parte da proposta. Mas as campanhas publicitárias e a pré-venda do McFish deram tão certo que a empresa acabou transformando-o em um produto ainda mais escasso do que o antecipado.
Este é um ótimo exemplo de marketing de escassez — estratégia que o Sérgio Eleutério, diretor de marketing do McDonalds, revelou ter utilizado na hora de pensar a divulgação do produto. Vamos entendê-la a seguir.
Escassez artificial
Essencialmente, esse tipo de estratégia capitaliza no FOMO — o Fear of Missing Out (Medo de Ficar de Fora). A disponibilidade em volume limitado, e numa janela curta de tempo, gera um senso de urgência no consumidor. Uma ilusão de escassez.
John A. Quelch, professor emérito da Harvard Business School, explica a ideia em um artigo já clássico, de 2007. “A falsa escassez nos encoraja a comprar mais cedo e talvez a comprar mais do que o normal”.
Somos bombardeados constantemente por estratégias de marketing que bebem dessa fonte, vide:
- Corra! Últimas unidades;
- Só até sábado!
- Os 100 primeiros seguidores que clicarem no link ganham 10% de desconto.
Isso sem contar os vários produtos e serviços limited edition, que vão de cerveja até roupas de grife e automóveis.
Na maior parte dos casos, incluindo o do McDonald’s, aparentemente não há motivos logísticos que impeçam a empresa de continuar oferecendo o lanche (os ingredientes não são raros ou limitados, e muitos países ainda contam com o produto no menu, como os EUA).
Além disso, a estratégia não depende só de curiosos que nunca provaram o lanche, mas também daqueles cujo interesse estava adormecido. Por ser um produto que estava fora de catálogo há alguns anos, a sensação de volta também traz aspectos nostálgicos. Não é só o sanduíche. Você também compra a memória afetiva que vem com ele.
Claro, tudo isso aliado a uma campanha publicitária mastodôntica. No arsenal do Méqui, influenciadores, redes sociais, outdoors, cartazes e até mesmo propagandas de TV foram utilizados para avisar os consumidores do Retorno do McFish™. Em suas redes sociais, a empresa escreveu: “Chegou a hora de matar essa saudade. O McFish voltou, mas é por tempo limitado. Aproveite!”. Perceba os elementos narrativos: nostalgia, limitação temporal… praticamente caricatura do marketing de escassez.
Falando nas redes, outro ponto forte desse tipo de marketing é o maior engajamento do consumidor. O fato de o produto não ser acessível a todos fez pipocar discussões nas redes sociais. As conversas sobre o produto (independente de o consumidor ter gostado ou não) aumentam a visibilidade da marca.
Isso traz o McDonald’s em si de volta à cabeça de consumidores que eventualmente já não pisavam numa loja com arcos dourados há um bom tempo – mesmo que esse indivíduo nunca tenha dado bola para o McFish (um produto que, se vendesse horrores lá atrás, nunca teria saído do cardápio).
Interesse do termo “McFish” no Brasil, nos últimos 12 meses. (Fonte: Google Trends)
Mas nem tudo são flores. Como explica Quelch, o hype agressivo em torno do produto convida a um escrutínio mais rigoroso. As críticas negativas podem ser amplificadas de maneira estratosférica. Além disso, essa frustração de alguns consumidores por não ter acesso ao produto — ou de ter que esperar tanto tempo por ele — pode criar uma certa rejeição à marca envolvida.
No caso do McDonalds, os prós aparentemente superaram os contras. Apesar dos internautas enraivecidos, o retorno temporário do McFish revitalizou o interesse dos consumidores pelo produto e, consequentemente, pela marca. E só no período de vendas antecipadas, a empresa já tinha ultrapassado em 10% a quantidade total de produtos que esperava vender (tanto na pré-venda quanto nos pedidos presenciais e via app que viessem depois, até o dia 18).
A marca ainda não deu indicativos sobre se pretende produzir mais McFishes. Por ora, fica a aula do McDonald’s sobre como capitalizar em cima da escassez artificial.
(E aos que — assim como a repórter do texto — não conseguiram colocar as mãos e papilas gustativas no McFish, forças. Vocês não estão sozinhos).