Como investir em 2021

Títulos de inflação, ações, fundos imobiliários, dividendos. Saiba quais são os melhores abrigos para o seu dinheiro, à luz da realidade que os especialistas esperam para este ano.

Texto: Tássia Kastner | Edição Alexandre Versignassi | Design: Laís Zanocco e Juliana Krauss 

O BTG Pactual diz que o Ibovespa pode bater em 152 mil pontos no final do ano – uma alta de 28% comparada com os 119 mil pontos do índice em janeiro. Mas o banco também alerta que, se as rodas da economia travarem, a bolsa fecha em 82 mil pontos – queda de 31%. E também crava que o mais provável, no fim das contas, são 133 mil – uma subidinha de 10%.

Fazer previsões para investimentos já é uma missão quase impossível. Agora multiplique isso pelo “fator 2021”, que pode ser chamado também de 2020 Parte 2, e a dificuldade em acertar o alvo tende ao infinito.

Só isso já seria o suficiente para seguir o mantra dos planejadores financeiros à risca: já que prever o futuro requer bola de cristal, e elas estão em falta no mercado desde a origem do Universo, o negócio mesmo é a diversificação e o foco no longo prazo – não, um ano não é longo prazo; pense em meia década.

“2020 não foi um ano típico, e 2021 não será muito diferente. Pode não ter tanta volatilidade, mas tem a ressaca do ano passado”, afirma Michael Viriato, professor de finanças do Insper.

Por “ressaca”, entenda a aceleração da segunda onda, a vacinação em massa apenas como uma miragem no deserto e o fim dos programas de estímulo financeiro, aqueles necessários para evitar o colapso da economia de qualquer país em meio a uma emergência desse quilate.

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Bom, se há algo que diferencia 2020 Parte 1 de 2020 Parte 2, é justamente isso: haverá menos estímulos governamentais. Nos EUA, o tiro final parece ser o último pacote, de US$ 1,9 trilhão, que tramitará no Congresso neste início de governo Biden. No Brasil, então, nem se fala. O déficit público em 2020 foi de mais de R$ 800 bilhões, contra R$ 95 bilhões de 2019. Não há espaço para mais dívida governamental.

É o que pensa o povo do mercado financeiro. Em 2021 o governo terá mesmo de apertar o cinto para reequilibrar o Orçamento. Só assim haverá segurança para investir. Em números: a dívida bruta do governo havia terminado 2019 em 74,3% do PIB, número que saltou para mais de 90% do PIB, segundo a estimativa oficial. Bem, independentemente de novas medidas econômicas de combate à Covid, essa dívida vai continuar subindo. A questão, para investidores, é que isso não ocorra de forma descontrolada – quando a dívida cresce demais em relação ao PIB, a capacidade de pagar essa dívida diminui. Pagar, na verdade, o governo paga. Mas, para isso, precisaria imprimir toneladas de dinheiro novo. E, quando você afoga a praça com dinheiro novo, cria-se inflação. Aí o risco é o de que a própria moeda deixe de ter valor. E sem uma moeda confiável, a economia entra em colapso (é o que aconteceu na Argentina, por exemplo, e, de forma mais grave, na Venezuela).

Tal desordem é o que os economistas chamam de “descontrole fiscal” – quando o governo gasta demais, depauperando a própria moeda. E é num cenário assim que se baseia aquele alerta do BTG, de uma eventual queda do Ibovespa para 82 mil pontos. O banco considera esse como menos provável do que a previsão otimista, de 152 mil, mas ele está lá para dar o recado ao pessoal de Brasília.

A ameaça de mais inflação, de qualquer forma, já é real. O IGP-M, índice de inflação que mede preços no atacado, fechou 2020 em absurdos 23%. É a maior alta de 2002. A inflação no varejo (aquela que realmente interessa, medida pelo IPCA) segue controlada – está dentro da meta do governo, um pouco acima dos 4% ao ano. Mas a engorda dos preços no atacado deve chegar, ainda que em parte, ao IPCA.

Um dos gestores mais respeitados do país, Luis Stuhlberger, do Fundo Verde, aposta que o IPCA pode superar os 6% lá por maio ou junho. Para evitar que continue subindo, o Banco Central talvez precise subir a taxa de juros antes (hoje em 2% ao ano) e em magnitude maior que o esperado.

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O consenso do mercado é o de que a Selic suba a 3% neste ano. Stuhlberger acha essa hipótese um tanto conservadora. O BTG também. Eles apontam 3,75% para o final deste ano. Seja como for, tudo indica que o juro real continuará negativo (abaixo da inflação – o que impede qualquer ganho real nos investimentos mais conservadores, que pagam só o CDI, que acompanha a Selic na anorexia).

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É esse cenário de juro real negativo que tem abalado o coração do pequeno investidor brasileiro. A renda fixa virou uma grande decepção. Logo, o investidor tem criado coragem de colocar o pé em outras classes de investimentos, mais arriscadas. É o caso da bolsa. Mas, como vimos, existe o risco de que ela flope no ano – um risco presente todo santo ano, e mais ainda neste 2020 Parte 2. Ou seja: se ficar na renda fixa já é garantia de perda para a inflação, sair dela pode representar um prejuízo ainda maior.

Não é simples olhar para toda essa incerteza e decidir o que fazer. Por isso, elaboramos esse pequeno guia de investimentos, com foco na realidade de 2021. Boa leitura, e boa sorte.

Para fazer uma reserva de emergência

Não importa se você é conservador ou agressivo. Todo mundo precisa começar pela reserva de emergência antes de colocar dinheiro em aplicações mais arriscadas. É aquela grana para você cobrir os gastos básicos caso fique sem renda. E que fica guardada nos investimentos mais conservadores, como o Tesouro Selic, os fundos DI, as contas digitais (que pagam o CDI) ou até na poupança. O que importa é que esteja acessível quando houver uma emergência, que possa ser resgatado na hora e sem prejuízo, com poucos cliques no banco ou na corretora.

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O triste é que essas aplicações rendem abaixo da inflação. E, como vimos antes, isso vai continuar acontecendo em 2021. Quem colocou R$ 10 mil no Tesouro Selic em janeiro do ano passado terminou 2020 com R$ 10.270. Para empatar com a inflação, deveria ter fechado o ano com R$ 10.400. Mas é do jogo. Fundo de emergência equivale a dinheiro debaixo do colchão. E, mesmo perdendo para o IPCA, os investimentos conservadores ainda rendem mais que o colchão.

Quanto dinheiro deixar ali? Você que sabe. Pode ser 60%, 80%, 90% de tudo o que você tem. Os especialistas, de qualquer forma, recomendam que seja pelo menos o equivalente a seis vezes o que você ganha hoje. Seu salário é de R$ 5 mil? Deixe R$ 30 mil na sua reserva de emergência. Ganha R$ 10 mil? Separe R$ 60 mil. E assim por diante. Só a partir daí faz sentido pensar em investimentos que trazem algum risco, como os que veremos a seguir.

Para se proteger da inflação

Para garantir um ganho acima da inflação sem correr riscos absurdos, a dica-mor é o título público Tesouro IPCA+. Com ele, você empresta dinheiro ao Tesouro Nacional, e ele te paga a inflação mais uma taxa de juros fixa. Para funcionar com esse objetivo, é preciso escolher os de prazo mais curto, com vencimento em 2026, segundo Viriato, do Insper.

Esses títulos pagam hoje o IPCA (seja ele qual for) mais uns 2,40% ao ano (a taxa exata varia todo dia). Se você guardar até 2026, garante essa (ótima) taxa de rendimento. Se você precisar do dinheiro antes, porém, provavelmente vai sacar menos do que aplicou. Esses títulos são resgatáveis, mas, grosso modo, o valor do resgate cai quando a Selic sobe.

Como a Selic deve subir mesmo, você precisa estar preparado para sacar só lá na frente.

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Os títulos de vencimento mais longo (2035, 2045) pagam mais – quase 3,5% ao ano além da inflação. Uma fortuna para os padrões de hoje. Mas não existe almoço grátis. Você precisa estar pronto para não precisar da grana por até um quarto de século.

Para ganhar mais sem ir para a bolsa

Existem algumas estratégias. Grosso modo, é preciso procurar um negócio mais arriscado que emprestar para o governo – o que é praticamente qualquer coisa. Pode ser CDB de bancos pequenos e médios ou dívidas de empresas (as debêntures – e além delas existem os CRAs e CRIs).

Debêntures e alguns CDBs de bancos pequenos também pagam no esquema “IPCA +”, garantindo a inflação mais um teco. Elas, porém, são mais arriscadas que títulos públicos. O governo, em última instância, pode imprimir dinheiro para honrar as dívidas do Tesouro. Uma empresa não.

Com a Selic a 2%, o povo andava desencanado desses investimentos. Aí, para conseguir dinheiro, empresas e bancos precisaram ser mais generosos na remuneração que oferecem a seus credores. Em vez de pagar 100% do CDI (aquele indexador que segue a Selic), agora as dívidas de banco pagam de 130% do CDI para cima. Começa a ficar mais interessante. Já na modalidade IPCA+, os bancos e empresas estão pagando mais ou menos 4% acima da inflação.

No caso das empresas, é preciso lembrar que, se ela der calote, a chance de você ver o dinheiro de novo diminui de maneira considerável. Nos CDBs, ao menos, há a proteção do FGC (Fundo Garantidor de Créditos) – que devolve até R$ 250 mil caso o banco emissor do CDB deixe de existir.

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Um jeito de emprestar para companhias, mas sem correr o risco de tomar um calote e perder tudo, é investir em fundos de crédito privado. O gestor do fundo investe em diversas empresas ao mesmo tempo, e você diminui o risco de perdas caso uma companhia quebre.

Por falar em gestor, aqui nessa categoria entram os fundos multimercado. Eles fazem a combinação de ativos de renda fixa e variável, sem que você precise mergulhar de cabeça em ações. E são recomendados para investidores de perfil moderado, uma alternativa a quem não está disposto a acompanhar de perto o sobe e desce diário da bolsa de valores.

Para colocar um pé em ações

A previsão do BTG de uma possível queda do Ibovespa no ano é uma exceção. De modo geral, o mercado financeiro aposta em alta da bolsa neste ano. Mesmo que os juros subam, ainda não deve ser o suficiente para contentar pequenos investidores. Eles vão continuar migrando para ações, o que pode sustentar uma certa valorização mesmo que a economia patine.

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A maioria das apostas mira num Ibovespa em 130 mil pontos para dezembro de 2021, o que representaria uma valorização de pouco menos de 10% no ano. E existe uma miríade de ganhar com essa alta esperada do mercado, caso ela venha mesmo.

Uma delas é comprar uma cota de um fundo ETF que replique um índice de ações. O mais famoso no Brasil é o Bova11, que segue o Ibovespa, e no qual é possível investir exatamente como se coloca dinheiro em uma ação de empresa. Abra o home broker, digite o nome do fundo e aperte em comprar. Voilá. Uma cota do fundo sai hoje por cerca de R$ 100 – nisso, o seu dinheiro fica automaticamente espalhado nas ações das 78 empresas que compõem o Ibovespa. O índice subiu, seu dinheiro sobe junto. Simples. Existem ainda outros ETFs, como os que seguem índices de small caps (empresas menores negociadas em bolsa). Esses são um pouco mais arriscados. Mas aí é aquela história: o potencial de ganho é maior também.

Os ETFs são uma boa forma de ter dinheiro em ações sem quebrar a cabeça pensando quais companhias escolher. Outro jeito é investir em fundos de ações. Nesse caso, você delega a um gestor a decisão de compra e venda de papéis.
Ao comprar um fundo como o Bova11, você espera ganhar exatamente a variação do Ibovespa. Num fundo com gestor, a meta é ver o dinheiro crescer mais que a variação do índice. E isso dá trabalho, então é preciso pesquisar se o fundo dá conta do recado.

O problema é que olhar o desempenho do fundo nos últimos anos é pouco efetivo para saber como será o ganho nos próximos anos. É o clássico “rentabilidade passada não é garantia de ganhos futuros”. Mas claro que um bom passado e reputação ajudam nessa conta.

Se você prefere um “faça você mesmo” e quer escolher quais empresas merecem o seu investimento, tudo bem. Mas tome alguns cuidados básicos para mitigar o risco. Escolha de cinco a dez papéis, de setores diferentes. Assim, se um segmento da economia vai mal, o outro pode compensar. Também vale dar uma espiada nas carteiras de ações recomendadas pelas corretoras. Só um detalhe: algumas dessas carteiras mudam com muita frequência, e isso pode ser apenas uma estratégia para que a corretora ganhe mais com taxas – já que ela ganha toda vez que você compra ou vende uma ação. E aí quem perde é você.

Para ter “renda passiva”

Renda passiva é quando o dinheiro trabalha para você e a grana pinga direto na conta sem que seja preciso fazer nada. A renda passiva mais amada no país é o aluguel, mas tem um jeito de fazer isso no mercado financeiro: via fundos imobiliários, os investimentos cuja renda vem do pagamento de aluguéis.

O produto foi pensado sob medida para o brasileiro: em vez de pagar rendimentos semestrais ou anuais, o mercado passou a creditar a grana mensalmente, igual um aluguel convencional.

Os fundos costumam ser donos de prédios de escritórios, galpões e terrenos onde foram instalados shoppings e agências bancárias. Compre uma cota do fundo e receba o aluguel que empresas pagam para usar os imóveis – normalmente rende uns 6% ao ano (bem mais do que a Selic). O risco é que o valor dos fundos flutua. Se um deles perder 30% do valor (normal, acontece), você perde 30% do seu dinheiro. De novo: ainda não inventaram almoço grátis.

Para 2021, a dica é óbvia. Prédios de escritórios tendem a diminuir (muito) de tamanho, por cortesia do home office. Agências bancárias viraram mico com o crescimento das fintechs – e com os bancões entendendo que agências são um custo muitas vezes desnecessário. Já galpões são uma aposta mais segura, já que o crescimento do comércio online (que depende de galpões para sua logística) veio para ficar. A dica central, então, é essa: pesquise nos sites especializados, e veja a composição de cada fundo.

Outro caminho para a renda passiva é buscar na bolsa empresas que sejam boas pagadoras de dividendos. Quando você compra uma ação, tem direito a uma fatia dos lucros das companhias. Mas a maior parte delas reinveste quase todo seu lucro. Então o único jeito de ganhar com elas é revendendo a ação mais tarde por um valor maior. Isso não é renda passiva.

Para ter dinheiro pingando bonitinho na conta, você precisa se concentrar em empresas que distribuem seus lucros generosamente. É o caso das companhias de energia. São empresas consolidadas, que não precisam fazer grandes investimentos. Aí o lucro vai quase que sem escalas para o bolso do acionista. Na carteira de dividendos recomendada pela XP, todos os papéis são desse setor. E a expectativa de retorno é de 6,9%, o que bate com folga a Selic. O risco, tal como nos fundos imobiliários, é a ação em si perder valor. Aí você perde na hora de vender.

Ah, a corretora Guide indica uma carteira de dividendos mais diversa: das oito empresas, apenas uma é de energia. De resto, lá estão Santander, Vale e B3, entre outras. O ganho com dividendos esperado também bate a taxa básica de juros, mas com uma folga menor: 4,5%. A diferença é que, nesse caso, os ovos não estão todos no mesmo cesto – alguma paulada do governo no setor de energia, severamente regulado, não vai dilapidar seu patrimônio.

Para fugir do Brasil

Hoje é fácil investir nas bolsas americanas, as maiores do mundo, mas isso significa combinar dois riscos: a flutuação dos papéis e a variação do dólar, já que as ações das companhias gringas são cotadas na moeda americana. Para 2021, o mercado financeiro até prevê alguma calmaria e aposta que a moeda vá terminar meio que onde está hoje, ao redor dos R$ 5. Ou seja: não haveria um grande risco cambial. Mas, de novo: é impossível cravar qualquer coisa sobre câmbio. Se o dólar bater, digamos, em R$ 3, você perderá boa parte do seu investimento em ações estrangeiras – e os analistas dirão que a depreciação da moeda americana era algo óbvio, que só não via quem não queria. Paciência.

Ter dinheiro lá fora, de qualquer forma, é uma ideia que sempre fez sentido. Historicamente, quem investe em Ibovespa e em S&P 500 de forma combinada, com metade da grana atrelada ao índice brasileiro e os outros 50% no principal índice americano, tem ganhos maiores e com menos risco no longo prazo (meia década, não esqueça).

E é fácil fazer isso. Da mesma forma que você compra um ETF do Ibovespa, dá para investir em um de S&P 500 pelo home broker. O nome do mais conhecido deles é IVVB11.

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Acha o mercado americano muito convencional? No fim do ano passado, a XP lançou um ETF para investir no mercado chinês. Essa é a principal aposta dos planejadores financeiros para 2021, já que a China tem apresentado a recuperação mais vigorosa entre as principais economias do mundo.

Ainda na B3, dá para escolher empresas gringas como se você estivesse lá fora. Tesla, Amazon, Facebook, Apple – todas estão nos home brokers nacionais (via BDRs, os recibos que valem por ações). Se optar por esse caminho, cuidado com as pedras: é que a liquidez é baixa, o que pode trazer prejuízo a quem precisar vender o papel e resgatar o dinheiro.
O caminho sem o problema da liquidez é abrir uma conta em corretoras gringas com atendimento em português e preparadas para lidar com a burocracia que é abrir uma conta no exterior – é o caso da Avenue e da Passfolio.

É isso. E para saber como cada um dos investimentos que mencionamos aqui vai se comportar ao longo do ano, siga acompanhando a Você S/A. Estamos juntos nessa.

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