A semana de Wall Street era para ser tipo um episódio filler numa série, aquele que não acontece nada, mas está prensado no meio de dois acontecimentos que definirão o rumo de uma temporada inteira.
Na semana passada, saíram os dados de inflação e desemprego. Na próxima, o Fed deve tirar o pé do acelerador e subir os juros em “apenas” 0,50 p.p. após quatro escaladas de 0,75 p.p.
Prensados no que seria essa semana de “pausa”, investidores foram procurar notícias. E acharam a depressão.
Nesta terça, rolou um encontro de banqueiros nos Estados Unidos. E a turma do J.P. Morgan, Bank of America, Goldman Sachs e cia. deu spoilers do que esperam para a economia em 2023. O cenário não é exatamente sombrio, mas é pior do que a turma de Wall Street vinha esperando.
O ano deve começar mais fraco, com uma recessãozinha suave. Não é nada surpreendente após o aperto feroz nos juros americanos, que saíram de zero e devem terminar o ano em 4,50%. Cortesia da inflação, que lá ainda está acima dos 6% em 12 meses (na medida do PCE, que é o indicador de inflação mais avaliado pelo Fed).
Não é só o dado concreto que conta. Nas palavras do CEO do Goldman Sachs, David Solomon, os executivos das empresas em geral estão pessimistas. “Quando eu falo com clientes, eles soam extremamente cautelosos.”
Aí que mora o perigo. A economia não é uma ciência exata, ela depende do comportamento dos seres humanos. Se todo mundo fica cauteloso e com medo de gastar, ela vai desacelerando até parar. Aquilo que era só medo pode de fato se tornar uma realidade, se o medo persistir por muito tempo.
Essa pode ser uma das explicações para a queda das bolsas americanas nesta terça. O S&P 500 recuou 1,44%, enquanto o Nasdaq cedeu 2%.
A cilada dessa história é que reduzir a atividade econômica é a única ferramenta que o Fed tem para conter a inflação. O mercado de trabalho americano está tão sólido que todo mês são abertas coisa de 100 mil vagas de trabalho a mais do que tem gente para preencher. Aí o salário sobe, aumentando a pressão sobre a inflação.
Se não tem como “criar” trabalhadores, o jeito é diminuir o número de vagas. E isso significa menos investimento e menos consumo.
Esse combo mais pessimista atropelou também o petróleo, que fechou abaixo de US$ 80 pela primeira vez desde janeiro – ou seja, desde antes da guerra da Ucrânia.
Sobre a commodity segue pesando a queda de braço sobre o teto ao preço do petróleo russo, imposto pela União Europeia, e a movimentação dos países da Opep+
A queda do petróleo seria o bastante para dragar a Petrobras e o Ibovespa, isso num dia de incertezas também no hemisfério sul. Surpreendentemente, o Ibov fechou em alta.
A PEC da Transição
A Faria Lima tava focada na TV Senado. Hoje foi o primeiro dia de discussões da PEC de Transição na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado. E foi típico episódio de vai-e-vem nas discussões sobre o limite do teto. Até que a sessão foi suspensa.
O lance é que o PT ainda está articulando o tamanho da desidratação na PEC para conseguir aprová-la. O senador Jaques Wagner, articulador do PT, topou baixar o valor do teto para R$ 145 bilhões em 2023 e 2024 – R$ 30 bilhões a menos do que o proposto pelo relator, Alexandre Silveira.
O texto ainda dá ao governo Bolsonaro o direito de gastar até R$ 23 bilhões (o excesso de arrecadação deste ano) fora do teto. O valor será necessário para fechar as contas da gestão, que vem bloqueando gastos previstos no Orçamento – como o Farmácia Popular, repasse para Universidades e salários de médicos residentes – por falta de dinheiro.
A indefinição – somada ao fato de que o novo governo está sendo forçado a ceder – deixou investidores locais relativamente confortáveis. Isso apesar de a série estar apenas no começo. O Ibovespa subiu 0,72%, a 110.189 pontos. Que venham as cenas dos próximos capítulos.
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Maiores altas
Ecorodovias (ECOR3): 7,20%
Lojas Renner (LREN3): 4,38%
IRB Brasil (IRBR3): 3,03%
CCR (CCRO3): 3,90%
Gol (GOLL4): 3,97%
Maiores baixas
Sabesp (SBSP3): -4,74%
PetroRio (PRIO3): -4,50%
3R Petroleum (RRRP3): -4,03%
Minerva (BEEF3): -3,29%
JBS (JBSS3): -2,81%
Ibovespa: 0,72%, a 110.189 pontos
Nova York
Dow Jones: -1,03%, a 33.596 pontos
S&P500: -1,44%, a 3.941 pontos
Nasdaq: -2%, a 11.014 pontos
Dólar: -0,25%, a R$ 5,2697
Petróleo
Brent: -4,03%, a US$ 79,35
WTI: -3,48%, a US$ 74,25
Minério de ferro: –0,64%, a US$ 111,55 por tonelada na Bolsa de Dalian