Foi nos 45 do segundo tempo: o último pregão de fevereiro só engatou nos últimos minutos de negociação. Foi quando Fernando Haddad falou em coletiva de imprensa para detalhar a reoneração dos combustíveis, anunciada pelo governo ainda ontem. Ao longo do dia a bolsa ficou praticamente estável, à espera da fala do ministro. Quando as novidades vieram, porém, o amargor se instalou de vez – e o Ibovespa firmou a queda, fechando em -0,7%.
Haddad informou que a reoneração da gasolina será de R$ 0,47 por litro e a do etanol, R$ 0,02 por litro. É uma reoneração apenas parcial, já que, antes da desoneração, os valores chegavam a R$ 0,69 e R$ 0,24, respectivamente. Já os tributos sobre diesel, biodiesel e gás de cozinha permanecem zerados até o fim deste ano, como já era previsto.
Mesmo sendo parcial, foi considerado uma vitória da ala econômica do governo, já que representa uma reversão da medida populista do governo Bolsonaro, que, em busca de recuperar a popularidade na véspera da eleição, zerou os tributos. Lula apoiou que a medida fosse estendida por dois meses, terminando no fim de fevereiro (hoje). A ala política do PT, por sua vez, queria que a isenção seguisse, pensando também na popularidade do governo – e não no rombo das contas públicas. Nesse cabo de guerra, a equipe técnica parece ter ganhado.
O problema é que a história não para por aí. Como a desoneração foi apenas parcial, e não total, não seria capaz de gerar os R$ 28,9 bilhões esperados – ficariam faltando R$ 6,6 bi. Mas o governo não quer abrir mão dessa receita, então buscou uma outra medida para cobrir essa diferença: taxar a exportação do petróleo cru por quatro meses.
A alíquota de exportação de óleo cru será de 9,2%, anunciou o ministro. Com isso, o governo espera arrecadar os R$ 6,6 bi faltantes. Enquanto isso, a estimativa da Petrobras é que essa nova medida afete 1% do lucro da empresa.
A taxação da exportação, uma medida muito mais que polêmica, não foi bem recebida pelo mercado. O Ibovespa, que chegou a se aproximar dos 107 mil pontos mais cedo, fechou na mínima do dia, aos 104.931 pontos, em queda de 0,74%.
Os papéis das petrolíferas, é claro, foram os que mais contribuíram para o tombo. Eles já vinham no vermelho antes, justamente porque a CNN tinha adiantado essa possibilidade do imposto sobre exportação do óleo cru. Mas fecharam nas mínimas com a confirmação de Haddad. PETR4 terminou o pregão em queda de 3,48%, e PETR3 caiu 4,39%. O tombo foi ainda pior para PetroRio (PRIO3): -9,04%, liderando o ranking dos perdedores do dia (veja abaixo). 3R Petroleum (RRRP3), por sua vez, cedeu 6,97%.
Não foi só isso. Segundo a GloboNews, o presidente Lula concordou, em reunião com que teve com Haddad e Alexandre Silveira (Minas e Energia) pela manhã, a mudar a política de distribuição de dividendos da Petrobras. A notícia, ainda não confirmada, também causou temor no mercado e ajudou a pressionar ainda mais os papéis da estatal para o fundo do poço.
Mais ruídos
Pior: esse nem foi o único fator na fala de Haddad que fez o clima na Faria Lima ficar nublado. O ministro voltou a levantar questionamentos sobre a política de preços da Petrobras, apesar de afirmar que nenhuma mudança nesse quesito está sendo discutida oficialmente.
Hoje, mais cedo, a estatal anunciou uma redução no preço da gasolina em R$ 0,13 por litro. O ministro disse que a expectativa era de uma queda ainda maior no preço e questionou se essa redução realmente ocupou todo o espaço possível, pedindo mais transparência da Petrobras.
Mais incisivos ainda foram os comentários de Haddad quanto ao Banco Central. Seguindo o discurso de Lula, citou que a Selic está alta demais e causando um “ efeito perverso na economia”. E o ministro pressionou, indiretamente, Roberto Campos Neto. Disse que, ao aumentar as receitas do governo, vai abrir espaço para cortes nos juros – desde que “ a autoridade monetária reaja da maneira prevista nas atas do Copom”.
O discurso pegou o mercado de surpresa logo nos minutos finais do pregão, azedando a bolsa, os juros futuros e o dólar futuro.
A moeda americana, aliás, fechou o mês de fevereiro em forte alta de 3%. Já a bolsa, em forte baixa de 7,49%.
E março já começa com o pé esquerdo. Afinal, duas novelas que causaram arrepios no mercado no mês (a dos combustíveis e a briga entre governo e BC) ganharam novos capítulos hoje na fala de Haddad, e mais uma dor de cabeça (o novo tributo sobre exportação de petróleo) apareceu. Mais ruídos entre o mercado e o novo governo foram encomendados. Fórmula para o caos? A ver.
Até amanhã.
Maiores altas
Embraer (EMBR3): 3,17%
Suzano (SUZB3): 3,02%
Dexco (DXCO3): 2,68%
Klabin (KLBN11): 2,37%
JBS (JBSS3): 2,35%
Maiores baixas
PetroRio (PRIO3): -9,04%
Pão de Açúcar (PCAR3): -7,17%
CVC Brasil (CVCB3): -7,06%
3R Petroleum (RRRP3): -6,98%
Yduqs (YDUQ3): -5,75%
Ibovespa: – 0,74%, na mínima de 104.931 pontos. No mês, queda de 7,49%.
Em Nova York
S&P 500: -0,32%, aos 3.969 pontos
Nasdaq: -0,10%, aos 11.455 pontos
Dow Jones: -0,71%, aos 32.654 pontos
Dólar: 0,34%, a R$ 5,2250. No mês, alta de 2,92%.
Petróleo
Brent: 1,79%, a US$ 83,45
WTI: 1,81%, a US$ 77,05
Minério de ferro: -0,78%, negociado a US$ 128,09 por tonelada em Dalian (China)