Em janeiro de 2016, as ações da Petrobras custavam R$ 4,80. Há uma semana, R$ 30. A alta espetacular, de 525% em cinco anos nos papéis preferenciais, os mais negociados, veio porque havia confiança na reestruturação do mercado de petróleo e derivados no país.
Tal confiança, você sabe, escafedeu-se,
E fez com que a Petrobras fechasse esta segunda-feira em um derretimento histórico, de 21,51% nas PN e de 20,48% nas ON, as que dão direito a voto.
As ações preferenciais e ordinárias da empresa respondem por 10% da carteira do Ibovespa. Ou seja: se só as ações da Petro tivessem caído e todas as outras tivessem ficado estáveis, o índice já mostraria uma queda de 2%.
Como o intervencionismo de Bolsonaro criou pânico, e várias outras empresas caíram feio também, o Ibov fechou numa queda Hitchcockiana, de 4,87%.
Só no caso da Petrobras, foram R$ 74 bilhões em perda de valor de mercado. Some a isso aos R$ 28 bilhões que já tinham ido para o espaço na sexta (19), e temos um buraco de R$ 102 bilhões. Isso dá um quarto do valor de mercado que a empresa tinha até sexta pela manhã. E equivale a um Banco do Brasil. Ou melhor, equivalia.
O valor do mercado do BB era de pouco mais de R$ 90 bilhões da sexta. Agora, um dia útil mais tarde, caiu em R$ 10,8 bilhões (tombo de 11,65%). O problema aí é o receio de que Bolsonaro demita André Brandão, presidente do BB. Jair entrou em rota de colisão com ele após o BB anunciar o fechamento de agências – coisa que todo banco está fazendo, dada a concorrência pesada com os bancos digitais, que não têm esse custo, e amealham milhões de clientes mesmo assim.
Entenda o grande problema da Petrobras
De volta ao caso Petro. Aqueles tímidos R$ 4,80, que faziam a empresa valer meros R$ 62 bilhões, foram consequência da política de controle de preços de combustíveis. O governo Dilma passou anos fazendo com que a Petrobras importasse combustível a um preço X e vendesse a X menos alguma coisa para o mercado nacional. Isso segurava os aumentos nos postos de gasolina, e sangrava a empresa. Estima-se que ela tenha perdido R$ 100 bilhões na brincadeira.
Depois disso, e com a queda de Dilma, baixou a Scarlet O´Hara no governo. A protagonista de E o Vento Levou jurou que não passaria fome novamente. O governo jurou, em nome de Nossa Senhora de Aparecida, Padre Cícero e Roque Santeiro, que a Petro nunca mais amargaria prejuízos. Para que o país fosse saudável, sua petroleira estatal deveria sair da UTI, cortar carboidratos e malhar todos os dias.
Para tanto, era preciso uma reforma. Porque acontece o seguinte: o Brasil é autossuficiente em petróleo, mas não em combustíveis. A produção nacional de gasolina e diesel não dá conta da demanda do país. Um em cada seis litros de gasolina (15%) é importado. De diesel, um em cada quatro (25%).
A autossuficiência, então, é só uma medida teórica. Ela só diz que, se tivéssemos uma capacidade de refino à altura da nossa demanda, não precisaríamos importar derivados de petróleo. Na prática, a Petrobras vende para as refinarias uma parte de sua produção e exporta o resto.
A Petrobras, porém, também domina a indústria de refino. Das 17 refinarias de combustível do país, que transformam óleo cru e gasolina diesel e tudo o mais, 13 são da Petrobras. Mas os números enganam. A capacidade das refinarias estatais é tão absurda que essas 13 da Petro respondem por 98% da produção de combustíveis do país.
Depois de 2016, ficou acertado que isso precisaria acabar. A Petrobras venderia boa parte de seu parque de refino, até reduzir sua capacidade a 50%.
Faz sentido. A extração de petróleo é um negócio bem mais lucrativo que o refino, e a capacidade da Petrobras nessa área está acima de qualquer suspeita. A ideia, então, era que a Petrobras concentrasse suas forças na produção de óleo cru, e a de combustíveis ficasse em grande parte com a iniciativa privada.
Mas não é simples. Faltam interessados nas refinarias da Petrobras. Companhias privadas, que poderiam adquirí-las e entrar para o mercado de produção de combustíveis, temem a concorrência com a própria Petro. Natural.
Para dirimir esse temor, o governo pós-2016 decidiu que as refinarias da Petrobras venderiam sua gasolina e seu diesel a preços do mercado internacional, faça chuva ou faça sol (ou seja, com ou sem greve de caminhoneiros, com ou sem inflação).
Aí ajuda. Sabendo que a Petrobras vai cobrar valores internacionais na gasolina e no diesel, você, grande empreendedor, pode comprar uma refinaria sem a insegurança de ter de lidar com uma concorrência eventualmente predatória da estatal. E, se sua refinaria não der conta da demanda, você terá como importar e revender por aqui com alguma margem de lucro.
Agora, porém, esse plano acabou. Bolsonaro resolveu decidir ele mesmo qual é o preço justo para a venda de combustíveis no país. Então pode escrever: na haverá compradores para as refinarias da Petro tão cedo. Ela seguirá como responsável por basicamente todo o refino em território nacional.
E seguirá importando combustível para revender com prejuízo, se o Presidente da República assim o desejar – como desejou na sexta, ao demitir Roberto Castello Branco e colocar um general em seu lugar. Joaquim Silva Luna, ao que tudo indica, será tão fiel aos desejos de Bolsonaro na Petrobras quanto Pazuello é na Saúde. Um problema.
Nisso, a Petro caminha de novo para o mesmo buraco onde já esteve. E talvez só saia depois que Bolsonaro tiver deixado de morar no Palácio da Alvorada. Como o inquilinato de Jair pode ganhar uma renovação por mais 4 anos a partir de 2022, não há como fazer planos para o médio prazo descartando abusos intervencionistas.
Fica a questão sobre se Paulo Guedes, que defendia a privatização da Petro, continuará passando recibo para o populismo tarifário de seu “chefe supremo”, como Bolsonaro se autodenomina em seus rompantes autoritários.
A “boa notícia” para quem não largou as ações da Petro é que uma cláusula do regimento interno da companhia obriga o governo a bancar os eventuais prejuízos que a empresa tenha com a importação de combustíveis. Mas governo, como “chefe supremo” da coisa, pode muito bem derrubar isso numa canetada. Se não o fizer, tampouco será bom: precisarão inventar outros impostos para cobrir (mais) esse eventual rombo no orçamento.
Elétricas
No fim de semana, após a demissão de Castello Branco, quem perdeu o sono foram as elétricas, já que Bolsonaro afirmou que “colocaria um dedo” no setor também, pois entende que as tarifas de luz devem baixar. Não se sabe o que ele pretende. O maior problema para as companhias seria uma revisão nos contratos de concessão. Logo, o setor fechou no vermelho. Energisa caiu 4,7%; Copel, 4,9%; CPFL, 7%.
B2W e Americanas
Variações de 20% são raras. Ainda mais raro é uma empresa do Ibovespa marcar uma queda de 20% (a Petro, claro) e outra companhia subir o mesmo tanto. Foi o que aconteceu com as Lojas Americanas. Na sexta, ela e a B2W divulgaram que estudam uma fusão – algo bem vindo no mundo do comércio eletrônico, onde a disputa é com os gigantes Mercado Livre, Amazon e Magalu.
O impacto da notícia foi bem menor para as ações da B2W, que subiram só 1,15%. Faz sentido. Ela já subiu 45% nos últimos 12 meses. As Lojas Americanas, até a última sexta, tinha caído 7% no mesmo período.
Boa sorte para a duas, que o governo não invente de arranjar alguma confusão para o setor delas também, como inventar algum imposto extorsivo para o comércio eletrônico para tapar o prejuízo da Petrobras.
É por essas que o comunismo jamais funcionou. Sem liberdade de preços, não há mercado. E sem mercado o que temos é uma União Soviética: uma eterna tapação de buraco, na qual todos perdem – as empresas, o Estado, os contribuintes. Em nome do populismo, porém, é isso que Bolsonaro tem feito. Nossa bandeira está ficando mais vermelha, e a nosso mercado financeiro também.
Maiores altas
Lojas Americanas: 19,88%
Embraer: 7,70%
Cielo: 4,76%
PetroRio: 3,71%
Klabin: 3,21%
Maiores baixas
Petrobras ON: – 21,51%
Petrobras PN: – 20,48%
Banco do Brasil: -11,65%
UGPA3: – 7,83%
Via Varejo: – 7,57%
Dólar: Alta de 1,57%, a R$ 5,46
Em NY
S&P 500: -0,77%, a 3.876 pontos
Nasdaq: -2,46%, a 13.533 pontos
Dow Jones: -0,09%, a 31.521 pontos
Petróleo
Brent (referência internacional): 3,70%, a US$ 65,24 o barril
WTI (referência nos EUA): 4,12%, a US$ 61,70 o barril
Minério de ferro: alta de 1,39% no porto de Qingdao (China).